Previdência privada: vale a pena investir?

Os planos de previdência privada oferecidos pelas empresas aos seus colaboradores têm ganhado cada vez mais espaço entre os brasileiros, mesmo em um cenário com diversas alternativas de investimento para a aposentadoria e em que os trabalhadores mudam de emprego com maior frequência. Esse crescimento pode ser explicado por uma série de fatores: a adesão automática a esses fundos, o aumento do emprego formal e, principalmente, o reconhecimento pelas empresas de que esse benefício é uma ferramenta eficaz para atrair e reter talentos.

Os planos de previdência privada empresariais, também conhecidos como coletivos ou corporativos, são aqueles em que a contribuição é descontada diretamente da folha de pagamento do trabalhador. A maioria das empresas contribui com esse benefício, ou seja, para cada R$ 1 investido pelo trabalhador, a empresa contribui com mais R$ 1 ou uma parte desse valor. Especialistas afirmam que esses planos estão entre os investimentos mais atrativos, embora seja necessário tomar alguns cuidados ao optar por eles.

Atualmente, 2,3 milhões de brasileiros possuem um plano de previdência desse tipo. Apesar de representarem menos de 10% dos trabalhadores do setor privado, esse número cresceu 3,4% desde que a Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (Fenaprevi) começou a divulgar esses dados, em outubro de 2022. O número de planos dessa modalidade também avançou 2,6%, totalizando 2,8 milhões no período.

O número de planos é maior do que o de participantes porque, frequentemente, as pessoas mantêm o plano da empresa anterior mesmo após mudarem de emprego, aderindo também ao plano oferecido pela nova empresa.

Em 2023, os brasileiros aplicaram R$ 5,2 bilhões em fundos de previdência oferecidos por empresas, descontados os resgates. Esse valor chama a atenção em um ano em que os fundos de investimento, em geral, enfrentaram uma retirada líquida histórica de R$ 127,9 bilhões.

A arrecadação tem crescido desde 2021, impulsionada pela adesão automática a esses planos. Desde março, quando uma pessoa é contratada por uma empresa, ela pode ser automaticamente incluída no plano de previdência, sem necessidade de manifestar interesse em aderir. No entanto, essa adesão automática depende da escolha da empresa, e a maioria ainda opera no modelo antigo, em que a adesão não é automática.

O aumento do emprego formal também tem contribuído para esse avanço. O Brasil criou 1,3 milhão de empregos com carteira assinada no primeiro semestre de 2023, descontadas as demissões, um aumento de 26,2% em comparação ao mesmo período de 2022.

“Após a pandemia, quando muitas pessoas utilizaram os recursos da previdência, as condições econômicas e do emprego melhoraram, juntamente com a capacidade de poupança, associadas a uma maior consciência da necessidade de uma reserva para o futuro, bem maior do que há alguns anos”, afirma Marcelo Malanga, diretor da Fenaprevi.

Além disso, cada vez mais empresas têm oferecido esse benefício como uma estratégia para reter talentos e aproveitar benefícios fiscais. “As novas gerações são mais desapegadas do empregador e buscam constantemente novas experiências. As empresas, por sua vez, estão criando atrativos para reter esses profissionais, e a previdência se torna um importante fator de atração quando a empresa contribui com um valor”, diz Malanga.

Um estudo da consultoria Mercer revela que, pela primeira vez, a maioria (51%) das 850 empresas brasileiras entrevistadas oferece planos de previdência aos seus trabalhadores. No entanto, mais da metade dessas empresas nunca revisou os planos corporativos, o que está em desalinho com as expectativas dos funcionários, já que 60% deles estão preocupados com sua situação financeira e admitem gastar horas de trabalho pensando em dívidas.

“Temos observado uma maior rotatividade de funcionários, e as empresas entenderam que, além de um bom salário, é necessário proporcionar bem-estar financeiro aos colaboradores. Os planos de previdência têm ganhado destaque nos departamentos de recursos humanos”, afirma Tiago Calçada, diretor de previdência da Mercer Brasil.

“Houve um movimento acelerado durante a pandemia, em que as empresas passaram a cuidar do bem-estar dos empregados, focando na saúde mental e física. E entenderam que, para os funcionários terem uma boa saúde mental, precisam também de saúde financeira”, acrescenta.

Esse bem-estar, segundo ele, é benéfico tanto para os empregados quanto para as empresas. “Pessoas com problemas financeiros gastam até dez horas por semana pensando neles. Isso significa que, mesmo presentes no trabalho, essas pessoas não estão totalmente produtivas, pois estão preocupadas com outras questões”, explica.

Na visão de Harenton Ribeiro Junior, responsável pelas soluções de previdência, investimentos e bem-estar financeiro da corretora Aon no Brasil, a reforma da previdência e a incerteza sobre a aposentadoria pública no país aumentaram a necessidade de as pessoas permanecerem mais tempo no mercado de trabalho antes de se aposentarem, o que é um incentivo adicional para aderirem aos planos de previdência empresariais.

Ele também observa que, na busca por proporcionar maior bem-estar financeiro aos funcionários, as empresas têm facilitado a adesão e a comunicação sobre os planos de previdência. “Antes, para aderir a um plano, o trabalhador precisava ler um formulário extenso, o que muitas vezes o fazia desistir. Agora, muitos processos são digitais”, comenta.

Vale a pena investir?

Planejadores financeiros aconselham que os empregados invistam nesses planos se a empresa oferecer uma contribuição além do aporte do funcionário, independentemente do valor dessa contribuição. No melhor cenário, se a cada R$ 1 investido pelo trabalhador, a empresa contribuir com mais R$ 1, a rentabilidade desse investimento será de 100%, no mínimo, sem contar os juros que o plano renderá e os benefícios fiscais da previdência.

“De imediato, é uma boa aplicação se contar com a contrapartida do empregador. Uma rentabilidade de 100% é significativa em comparação com outras opções do mercado”, afirma Clay Gonçalves, planejadora financeira certificada pela Associação Brasileira de Planejamento Financeiro (Planejar). “Recomendo aproveitar esse benefício, que é muito interessante para o longo prazo”, acrescenta.

Contudo, ela destaca a importância de observar as regras de saída do plano para evitar surpresas ao resgatar o recurso. O trabalhador pode resgatar o dinheiro acumulado pela contribuição individual a qualquer momento. Já o valor aportado pela empresa pode ser retirado na saída da empresa ou na aposentadoria, mas, em alguns casos, apenas uma parcela fica disponível, dependendo do tempo de trabalho ou da forma de desligamento (sem ou por justa causa).

Luciana Seabra, presidente e chefe de análises da Indê Investimentos, acredita que vale a pena aproveitar esse benefício da empresa mesmo que o fundo de previdência não seja sofisticado ou tenha um custo alto. No entanto, ela alerta que a maioria desses produtos é de renda fixa, mais conservadora, mas que uma carteira diversificada, com renda fixa e renda variável, é mais adequada para prazos longos, de dez anos ou mais.

“É comum que as empresas não tenham muito conhecimento sobre previdência. Recomendo que as pessoas façam um ativismo junto ao RH, solicitando fundos mais diversificados. Geralmente, a mesma seguradora que tem o convênio com a empresa oferece produtos de gestoras independentes, que são melhores do que os da própria seguradora”, sugere. “Você pode investir em bons fundos de previdência e aproveitar o aporte da empresa. Não precisa aceitar apenas o que é oferecido”, conclui.